O avanço da tecnologia vai criando, no mercado financeiro, incontáveis variantes para empresas e investidores, a exemplo das moedas digitais. Em grande variedade, com destaque para o bitcoin, passam a compor os ativos financeiros circulantes, com o nome próprio de criptoativos. Esse avanço tecnológico, rompendo barreiras comerciais e até ideológicas, acelerou a globalização da economia, decorrendo daí a internacionalização também do sistema financeiro. O ambiente virtual brasileiro para compra e venda de criptoativos é unificado internacionalmente.
Surgem, então, a preocupação e a necessidade de regulamentação desse mercado, em diversas vertentes, para proteger a integridade do sistema financeiro, os direitos dos investidores e principalmente os interesses fiscais, sob pena de se criar uma gigantesca economia paralela à oficial. Organismos internacionais, como o Gafi – Grupo de Ação Financeira Internacional, ao qual o Brasil é filiado através do Coaf – Conselho de Controle de Atividades Financeiras, estimam que a economia paralela mundial oriunda de atividades informais e criminosas, corresponde a 20% do PIB global. Como juiz federal por três décadas, passei 12 anos na titularidade de uma vara especializada no julgamento de crimes financeiros e de lavagem de dinheiro. Essa intensa vivência me assegurou de que o mercado financeiro e o de capitais formam uma plataforma, cada vez mais virtual, para a lavagem de dinheiro e a evasão de divisas.
O mercado das criptomoedas, no Brasil, ainda não está devidamente regulamentado. Na esfera criminal, as operações ilegais podem ser enquadras na Lei de Lavagem de Capitais (9.613/98), bastante rigorosa especialmente quanto ao confisco de bens, e na lei que define os crimes contra o sistema financeiro nacional, cujas penas são pesadas. Aplicam-se técnicas especiais de investigação, a exemplo da quebra do sigilo fiscal, telefônico e telemático e vigilância bancária. Todavia, a falta de identificação do investidor em criptomoedas torna difícil esse tipo de investigação.
Na esfera financeira, cabente ao Banco Central do Brasil, com o apoio da Comissão de Valores Mobiliários, a competência para regular o mercado, incluindo autorizações para empresas atuarem na área, a normatização ainda está se concretizando. No âmbito fiscal, a Receita Federal disciplinou a obrigatoriedade de prestação de informações tanto por investidores como por exchanges, assim denominadas as pessoas jurídicas que ofereçam serviços de ativos virtuais, intermediando, comprando, vendendo ou custodiando criptoativos.
A operadora exchange fica obrigada a registrar as operações na Receita Federal quando, para fins tributários, for domiciliada no Brasil. Quando domiciliada no exterior ou não sendo a operação com criptomoedas realizadas por exchange, a obrigação é da pessoa física ou jurídica titular do investimento, desde que o valor seja superior a R$ 30.000,00. Para o registro das operações, o interessado, no prazo previsto, sob pena de multa, deve acessar o sistema da Receita Federal chamado Centro Virtual de Atendimento (e-CAC), com direito a posterior retificação.
A partir de 2022, a legislação passou a punir o estelionato com criptomoedas, praticado mediante artifício, ardil ou qualquer outra postura fraudulenta, cominando pena de até 8 anos de prisão. Além dos crimes previstos na lei de lavagem, os atuantes nesse mercado virtual devem ser orientados quanto a delitos financeiros, que são vários os definidos na legislação brasileira, dentre eles fazer operar exchanges ou outra instituição financeira sem autorização do Banco Central. Gerir fraudulentamente qualquer pessoa jurídica atuante no mercado financeiro pode render uma pena de até doze anos de prisão. Evasão de divisas mediante operação de câmbio não autorizada é outro delito que, além de gerar lavagem de dinheiro, rende pena alta.
O advogado exerce papel indispensável nesse cenário, como consultor jurídico e sobretudo na defesa de empresas e de investidores. Lutar pela garantia da livre iniciativa de seus clientes é dever do advogado e um divisor de águas. Todavia, deve estar devidamente capacitado, pois se trata de matéria que exige conhecimentos específicos, englobando a defesa não só no âmbito penal, mas também no patrimonial. A legislação é rigorosa quanto às penas previstas e ao confisco de bens e valores, exigindo-se extrema habilidade do defensor.
Por fim, a exchange é pessoa jurídica pertencente ao sistema financeiro nacional. Instituição financeira é uma pessoa jurídica que se dedica, cumulativamente ou não, a captar e aplicar recursos financeiros de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, incluindo criptomoedas, a negociar, intermediar ou administrar valores mobiliários.
Por Dr. Odilon de Oliveira, Ex-juiz federal e advogado, integra o Escritório Adriano Magno & Odilon de Oliveira Advogados Associados.