Categoria busca negociar manutenção dos benefícios conquistados em acordos coletivos
Neide Maria Rodrigues, 58 anos, trabalha como bancária há 23 anos e assumiu o cargo de presidente do SEEB CG-MS (Sindicato dos Bancários de Campo Grande MS e Região) em junho deste ano. A presidente destaca a necessidade da união da classe trabalhista, contra a implantação da Medida Provisória (MP) 905/2019, que muda pontos propostos na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), e é conhecida como a nova reforma trabalhista. A classe dos bancários, que apenas em Campo Grande e região possui mais de 2 mil filiados ao sindicato, na tentativa de se assegurar, tem buscado garantir a manutenção dos benefícios estabelecidos por meio do acordo coletivo vigente.
“Com a reforma trabalhista, o negociado prevalece sobre o legislado” destaca a presidente dos Bancários, sobre as mudanças previstas na MP 905
A MP 905 afeta diretamente a carga horária, reduz a remuneração inicial e retira a responsabilidade da empresa em casos de trabalhadores que sofrem acidentes durante o trajeto de sua casa até o local de trabalho. A categoria acredita que a MP 905 será rejeitada durante votação no Congresso Nacional, e para garantir a continuidade dos direitos preestabelecidos, o órgão busca o apoio dos parlamentares de Mato Grosso do Sul, para tentar impedir que a medida protetiva siga adiante. Confira a entrevista com a presidente do SEEB CG-MS:
O Estado – Como a notícia da implantação de uma MP foi recebida pela categoria?
Neide Maria – Nós, os bancários, temos uma convenção coletiva nacional, em que nós realizamos um acordo em 2018, que possui vigência por dois anos. Portanto esse acordo ainda está em prática, e possui vigência até agosto de 2020; a próxima negociação ocorre em setembro. Com a reforma trabalhista, o negociado prevalece pelo legislado, então, se nós temos um acordo, ele deve ser cumprido, mas isso é o que nós esperamos. Com a implantação dessa medida provisória, nós ficamos surpresos ao entender que existia um prejuízo para a categoria.
O Estado – Houve uma reunião em São Paulo com os representantes dos bancários de todo o país; o que foi decidido durante essa reunião?
Neide Maria – Nós tivemos uma negociação dia 14, dois dias após a medida ser publicada, no Rio de Janeiro, em que nós da Fenaban [Federação Nacional dos Bancos], nos reunimos com os representantes dos banqueiros, e colocamos em pauta a implantação dessa MP, pois, obviamente, eles haviam procurado o governo para se beneficiar dessa medida. O que está nessa medida é o que foi debatido durante a negociação em 2018, e eles não negaram, assumiram que eles estiveram com o governo para realizar essas alterações. Durante a conversa, ficou acertado que a medida não seria implementada até que um novo acordo fosse fechado. Com isso nós abrimos uma nova agenda, e ficou para o dia 26 uma nova reunião. Nesse dia, nós ficamos por quase 10 horas debatendo os itens que abrangem a categoria dos bancários, e com isso nós propusemos um aditivo de compromisso, para cumprir o que estava previamente acordado.
O Estado – Quais são os pontos em que as mudanças previstas na MP abrangem a categoria dos bancários?
Neide Maria – Uma das questões é a jornada de trabalho – atualmente nós trabalhamos de segunda a sexta-feira –, e a questão das horas, que são 30h, e passariam a 6h, chegando a 44h semanais. Não é simplesmente porque os bancários não querem trabalhar, é que é preciso passar por uma negociação com o comando nacional para que isso ocorra. Por várias vezes já foram feitas negociações, nas quais, esporadicamente, era conversado para que os trabalhadores recebessem as horas extras, sobre os dias em que foi prestado serviço fora do horário de trabalho. Com a MP, existe esse aumento de carga horária sem tratar em momento nenhum da remuneração, isso para o funcionário, que trabalha mais e acaba ganhando menos. Já que nós temos essa convenção em vigência, nós exigimos o cumprimento dela. Outro ponto abordado trata do salário dos jovens, que seria R$ 1,5 mil, enquanto o piso da nossa categoria é de R$ 2,4 mil, portanto nós pedimos também o respeito ao piso da categoria. Ainda existe a questão do PRL [Programa de Participação nos Lucros e Resultados], e essa nova MP aponta que o debate sobre os ganhos seriam feitos diretamente com o funcionário, excluindo o sindicato da participação na discussão da participação dos lucros. Imagina um banco, que é uma potência, em que mesmo durante as crises eles possuem um valor, e nunca estiveram em crise, e de repente chegar o trabalhador e ter de discutir isso com o patrão; é uma situação difícil.
O Estado – Foi decidido durante a negociação entre o sindicato com os representantes dos banqueiros?
Neide Maria – Ainda está em aberto a permanência desse aditivo, mas ficou acertado que vai existir; nós propusemos também o prolongamento da vigência do acordo, que “venceria” em agosto, mas se estenderia para dezembro de 2020. Nós acordamos que eles não irão implantar a MP na categoria, e no caso da necessidade de trabalho durante os fins de semana, será previamente debatido com representantes.
O Estado – A categoria tem buscado formas para garantir a manutenção dos direitos conquistados por intermédio dos acordos e impedir que os termos definidos na MP afetem diretamente os trabalhadores?
Neide Maria – Juridicamente, nós poderíamos buscar meios para fazer valer nosso acordo, mas nós optamos por fazer um acordo, já que sempre houve negociação, e é um processo muito difícil. Em 2018, foi um processo longo para que se chegasse aos termos definidos, então nós buscamos novamente essa negociação. Nós acreditamos que essa MP não vai passar pelo Congresso; existem várias emendas a serem debatidas, mas nós da categoria não vamos esperar para depender disso. Nós escolhemos dar início à negociação, para que, caso seja aprovada, nós tenhamos a vigência desse aditivo para nos resguardar.
O Estado – Com o término do prazo desse aditivo a categoria passaria a responder pelas normas previstas na MP?
Neide Maria – Nossa convenção coletiva está prevista para agosto de 2020. Mas a negociação é iniciada bem antes, e provavelmente em maio nós já estaremos fazendo agenda de negociação com a Fenaban. Eles possuem interesse em continuar negociando com a categoria, então, como o negociado prevalece sobre o legislado, para nós é muito mais interessante fazer um bom acordo, então acabaria não afetando tanto. Nós somos a única categoria organizada nacionalmente, e que possui uma convenção coletiva nacional.
O Estado – Então, por se tratar de uma rede um pouco mais organizada, os bancários não sofreriam, de forma abrangente, com as medidas previstas na MP?
Neide Maria – Na verdade, hoje os bancários adoecem muito: se fizer uma comparação com dez anos atrás, os bancários sofriam muito de LER [lesões por esforços repetitivos] e DORT [distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho], e hoje a doença do bancário já não é mais essa. Assim como os professores, os bancários ficam doentes mentalmente – a maioria dos trabalhadores já trabalha 8 horas, mas eles ganham para trabalhar. E com a implantação dessa MP, apenas os caixas trabalhariam 6 horas, e essa é uma preocupação para o trabalhador; nós queremos que ele seja cuidado, e que não chegue a adoecer, e hoje nós vemos o contrário. A medida vai gerar penalizações para os trabalhadores, ainda mais voltada ao acidente de trabalho – caso ocorra algo entre o percurso da sua casa até seu emprego, antes você era amparado legalmente, e agora deixa de ser, é um prejuízo muito grande, em que, se você se desloca da sua casa ao seu trabalho, a empresa deixa de ser responsável pelo trabalhador; nós percebemos o sucateamento do SUS e do INSS, é algo muito ruim, em que o momento não é bom para o trabalhador, em que o governo não está preocupado com os trabalhadores, e, sim, o compromisso que ele tem é com os grandes empresários que mandam neste país, e com o sistema financeiro.
O Estado – No seu ponto de vista, então a implantação dessa MP é para favorecer os grandes empresários, que movimentam o sistema financeiro do país?
Neide Maria – Isso é um prêmio para eles, e na verdade essa pressão vem desse sistema, pois com isso eles são desonerados, e acaba prejudicando nós, os trabalhadores. Este, na verdade, precisa ser um momento de união da classe trabalhadora, e de avanços, nós não estamos preocupados apenas conosco, é necessário que trabalhadores, sindicatos, federações e confederações estejam juntos, para que a gente possa evitar um dano maior daqui para a frente.
O Estado – Quais são os próximos passos que o sindicato estuda a seguir, após essas reuniões?
Neide Maria – Nós estamos procurando os parlamentares de Mato Grosso do Sul, os deputados federais e os senadores, para que nós tenhamos o apoio deles caso essa medida vá para votação no Congresso. Neste momento, eu acredito que todas as classes afetadas estão buscando eles, para que possam dizer seus pontos de vista sobre essa medida, e também sobre a questão da privatização dos bancos públicos, a que nós somos contrários, a essa privatização. Nós estamos buscando os parlamentares, para que isso não ocorra, pois queremos conversar e dialogar para dizer a importância desses bancos para nós e para a população em geral.
(Texto: Amanda Amorim)