Por Rafaela Alves [Jornal O Estado]
Consideradas como a “geração pandemia”, crianças nascidas no ano de 2020 chegaram em um momento difícil, a pandemia da COVID-19. O convívio dessas crianças se restringiu aos pais, interagiram com os parentes por videochamadas e os momentos mais marcantes foram divididos com familiares e amigos pelas redes sociais. Os passeios e encontros com outras crianças estão acontecendo há pouco tempo, principalmente agora, com a população vacinada contra a doença.
A psicóloga clínica Fernanda Camargo destacou que é na primeira infância que diversos marcos de desenvolvimento ocorrem. A necessidade do isolamento social acabou por privar essas crianças de interações sociais e estímulos sensoriais importantes para esta fase da vida. Ela afirmou ainda que as crianças nascidas nesse período, ou um pouco antes da pandemia, estão entre as mais afetadas.
“A primeira infância é o momento em que as crianças desenvolvem diversas habilidades cognitivas, aprendizagem e de socialização. Aqui que estruturas cerebrais se consolidam e vão servir como base ao longo de toda a vida. Esse desenvolvimento foi prejudicado pela necessidade de distanciamento social. Prejuízos como desigualdade intelectual, atraso de linguagem, medo de separação dos pais, dificuldade de interação e dificuldade de manter uma rotina, o que para as crianças é essencial”, explicou.
A fisioterapeuta Daniela Domingos, 28 anos, estava nas últimas semanas de gestação quando começaram a se tornar mais frequentes as notícias sobre a confirmação dos primeiros casos de COVID-19 no país. “Lembro de que não cheguei a fazer as últimas consultas do pré-natal, foi um susto misturado com medo. Naquela época era algo ainda mais desconhecido, ninguém acompanhou o meu parto”, relembrou.
Thomas, hoje com um 1 ano e 11 meses, nasceu no dia 26 de maio de 2020, pouco mais de dois meses após os primeiros casos da doença registrados no Estado. “Não recebemos visita, ficávamos em casa. Apenas meu marido saía para fazer o mercado e quando tínhamos de levar o Thomas para fazer exames ou tomar as vacinas de rotinas.
Uma situação bem diferente do meu primeiro filho, Bento, de 3 anos, em que cheguei da maternidade e já recebemos visitas”, contou.
E toda essa situação interferiu em algumas situações. Segundo Daniela, até para andar de carro, Thomas tinha dificuldade. “Até que em relação à convivência com outras pessoas foi tranquilo, mas pensávamos muito em sair de carro com ele, era o trajeto inteiro chorando. Inclusive quando pegamos a estrada pela primeira vez, ainda bem que era uma viagem de poucos quilômetros até a chácara do meu sogro”, assegurou.
Outra criança da “geração pandemia” é Gustavo, de 1 ano e 8 meses. Sua mãe, a dentista e professora universitária Fernanda Oliveira Santiago, afirmou que agora, indo para a escola, Gustavo começou a se expressar mais. “Por ser da saúde, nós nos isolamos mesmo, até começar a saber o que era o COVID realmente. Então o Gustavo acabou perdendo o contato com outras pessoas, inclusive com familiares, e ficou bastante grudado comigo e com o pai.”
Segundo a professora universitária, Gustavo demorou um pouco para brincar com outras crianças. “Ele se adaptou bem ao berçário, no começo grudou nas professoras e com medo das outras crianças por falta até mesmo de convivência, mas hoje, depois de quatro meses, ele já brinca, faz atividades e está se expressando melhor, começando a falar. Então o desenvolvimento dele com outras crianças ajudou muito”, declarou.
A psicóloga reforçou que é por meio de trocas de experiências com outras crianças e adultos que os pequenos se desenvolvem e, neste sentido, a escola tem um papel fundamental neste período de retomada. “A escola nesse contexto é essencial para identificar as necessidades, orientar as famílias, manter o vínculo e dar suporte visando promover os processos de aprendizagem das crianças, dentro e fora do ambiente escolar.”
“Desenvolver atividades que possam estimular as crianças, no desenvolvimento motor, fala, socialização, promover imaginação é algo que pais e educadores podem fazer daqui em diante para promover maior desenvolvimento nesse momento de transição para o retorno das novas atividades”, reiterou.
Nascidos vivos
Mato Grosso do Sul teve em 2020, primeiro ano da pandemia, o menor número de nascidos vivos desde 2007 e manteve a perspectiva do Brasil que também encerrou o ano de 2020 com queda no número de nascimentos. O levantamento leva em consideração dados do Sinasc (Sistema de Informações de Nascidos Vivos), do Ministério da Saúde.
Em 2020 nasceram no Estado 41.123 bebês, ao passo que há 13 anos, 2007, foram 38.621, uma redução de 6,4%. Mas ao compararmos com 2017, ano com maior número de nascidos vivos desde o ano de 2000, o índice aumenta para 8% de queda. Já em relação ao ano de 2019, a redução foi de 5,88%, índice acima da média nacional que foi fixada em 5%. Naquele ano foram 43.695 nascidos vivos.