José Fernandes Vilas Doutor em Burnout em profissionais de educação e autor do livro “Quando o sucesso vira burnout- a síndrome do esgotamento profissional” conta como superar o luto e o que podemos aprender nessa fase.
Estamos vivendo o maior desastre biológico da história da humanidade de todos os tempos. No Brasil foram mais de 600 mil mortes. Jamais se ouviu falar de um momento tão atípico em nossas vidas, praticamente um holocausto. Por conta do COVID-19, milhares de pessoas estão perdendo ou já perderam, centenas de amigos, filhos e familiares. É impossível desconhecer alguém que não tenha uma terrível história para contar.
Por complicações deste vírus perdemos além de pessoas que amamos que pertenciam nosso rol de amigos, enlutados ficamos com a perda precoce do ator multifacetado e queridíssimo e humorista Paulo Gustavo, faleceu aos 42 anos, em decorrência das complicações do coronavírus, deixando seus dois filhos tão pequeninos e seu esposo Thalles devastados. Parece que o mundo ficou pior, estamos vivendo uma era também intitulada por muitos internautas como Armagedom, o fim dos tempos.
No meio desse turbilhão de desastres, morre-se também quem não é vítima diretamente desse vírus maldito, como é o caso da cantora sertaneja Marília Mendonça, deixando filho, esposo e família e uma legião de fãs desamparados. Muitas pessoas, mesmo sem conhecê-la pessoalmente, ficaram emocionadas e sofreram com a morte prematura da artista.
Tanto Paulo Gustavo quanto Marilia Mendonça entraram nas nossas casas de uma maneira tão espontânea e honrosa, que passamos a considera-los como membros da nossa prole. Ambos, deixaram um legado com a sua arte. E ao partir nos deixaram órfãos de maneira abrupta. Nas redes sociais, muitas homenagens e mensagens mostraram que, realmente, houve uma comoção nacional.
O Estado online conversou com exclusividade com o neurocientista José Fernandes Vilas, mais conhecido como Dr Burnout, pela sua área de atuação, sendo um dos maiores pesquisadores no Brasil na área do esgotamento profissional (burnout), para entender melhor o motivo pelo qual a morte de celebridades mexe tanto com as pessoas. Ele também explicou mais sobre o luto e deu algumas dicas valiosas de como passar por esse período.
Mas afinal, por que nos emocionamos e sentimos tanto a morte de pessoas que nunca conhecemos pessoalmente?
“Tal emoção, além de um sentimento nobre pela causa, pode até gerar um estranhamento pelos que não compartilham do mesmo sentimento de tristeza, causando, além de declarações de afeto pelos que se sentem enlutados como do outro lado, entrado de comentários nas redes sociais questionando a “inverdade” ou “insincero” afeto dos internautas”.
De fato há uma justificativa plausível embasada na psicologia para definir este evento de massa. Os fãs enlutados lamentam não a perda de um artista, mas também aspectos em comum que existem entre a pessoa e o artista. Na Neurociências chamamos isso de neurônios espelhos. Vocês já conheciam esse termo? Então, vamos exemplificar para ficar de fato entendido e argumentado. Quem chorou pela perda de Paulo Gustavo não sentiu tristeza apenas pelo seu prematuro falecimento, e sim também por todos os momentos em que a obra de Paulo gerou impacto em sua vida. No caso de Paulo Gustavo, existe toda uma gama de situações que era sabido pelo publico e que as pessoas se identificaram, como o casamento gay, as dificuldades de ser um gay em um país homofóbico, a dificuldade de uma mãe que descobre que seu filho e gay e tem que lidar com naturalidade com a situação tão delicada, filho de pais separados, homem que se veste de mulher para imitar sua mãe em sua peça “minha mãe é uma peça”, ou ter filhos por barriga de aluguel e por serem pais gays. São situações que estão presentes em cada espaço deste nosso país. Toda essa imagem criada entorno de Paulo Gustavo gerou um rede de afinidades, onde as pessoas sentiam como se PG fosse um parente que frequenta a sua casa.
Quando ouvimos música, como no caso da artista Marília Mendonça, somos mais propensos a formar memórias fortemente ligadas às canções. Até porque Marília Mendonça, a rainha da sofrencia, quando pensarmos na música dessa artista já criamos em nosso subconsciente a evocação de situações que ocorreram onde sua musica esteve presente marcando aquele momento como único. Isso acontece veementemente em inicio de relacionamentos onde escolhemos a “musica tema do casal”, ou em outro momento de divórcio onde conectamos a nossa dor a músicas de sofrencia da mesma artista.
Neste sentido, cria-se um laço de intimidade, como se o artista e sua musica ou o ator e sua arte, fossem protagonistas nas suas vidas. É como perder algo dentro de si mesmos, de suas memórias.
A partida de uma celebridade amada pelo seu publico, também nos lembra do quanto somos mortais. Pois podemos morrer da queda de um avião, ou uma batida de carro ou pela internação em UTI devido complicações do covid-19.
A importância da presença de artistas em nossas vidas, chancelando as nossas experiências, podem deixar marcas tão profundas que existem pessoas que possuem muita dificuldade de lidar com essa perda, como se estivesse perdendo alguém que sabe dos seus sentimentos mais intimas, ficando órfão de um amigo tão querido. Isso não desvalida as reações de luto que indivíduos podem sentir, e sim sugere o poder da mídia contemporânea. Somos tão expostos pela presença de celebridades em nosso dia a dia que a perda é, de fato, real.