Lideranças indígenas de Amambai (MS) acreditam que foi criminoso o incêndio que destruiu a casa de reza da Aldeia Tekoha Guapo’y, da etnia guarani-kaiowá, ocorrida no sábado (2), na cidade a 352 quilômetros de Campo Grande.
O cacique da etnia, Elizeu Guarani, acredita que o ato foi motivado por intolerância religiosa. “Vínhamos sofrendo ameaças constantes de pessoas que não respeitam nossas tradições”, disse à “Folha”, por telefone, sem dar mais detalhes sobre as ameaças sofridas.
Segundo Elizeu, o incêndio ocorreu por volta das 19h30 (de MS), quando dois indígenas deslocados para fazer a segurança da casa de reza foram se abrigar em uma área coberta com o início de uma forte chuva que caiu. Quando voltaram, as chamas já consumiam o local. Ninguém ficou querido.
“Apesar da chuva, a casa era feita de capim seco. Em meia hora tudo já estava destruído. Ainda não sabemos quem possa ter colocado fogo no local. Mas estamos tristes porque é o nosso tempo sagrado. Erguemos com muito sacrifício e num piscar de olhos foi tudo queimado”, disse Elizeu, que também é coordenador- executivo da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil).
A Polícia Civil de Amambai abriu inquérito para apurar as causas do incêndio, mas não havia suspeitos ou casas do fato identificados até a conclusão desta reportagem.
Os indígenas abriram uma central de doações para reerguer a casa de reza. Cerca de mil pessoas moram na reserva, constante alvo de briga entre indígenas e produtores rurais.
É o segundo caso de incêndio criminoso de templo religioso indígena em Mato Grosso do Sul em pouco mais de um mês. Em 19 de agosto, foi a casa de reza da Aldeia Rancho Jacaré, em Laguna Carapã (MS), a 288 km da Capital Campo Grande. O crime ocorreu enquanto a população do local, de cerca de 400 pessoas, inaugurava outra casa de reza na mesma reserva.
Entre janeiro e março de 2020, duas casas de reza foram queimadas: uma na Aldeia Jaguapiré, em Tacuru (a 427 km da Capital) e outra na comunidade Laranjeira Nhanderu, em Rio Brilhante (a 150 km de Campo Grande).
Em 9 de julho de 2019, o alvo foi a casa de reza da Aldeia Jaguapiru, em Dourados, a 214 km de Campo Grande. Entre os objetos que se perderam está o Xiru, uma espécie de cruz sagrada para os indígenas, dois foram retirados a tempo, mas o terceiro, com mais de 180 anos de história, foi consumido pelo fogo.
Em todos esses casos anteriores registrados, nenhum autor ou motivação do crime foi esclarecido pelas autoridades do Estado.
O único incêndio criminoso em aldeias indígenas sul-mato-grossenses resolvido foi o incêndio de, pelo menos, três casas na Aldeia Avae’te, em Dourados, em 6 de setembro. Seguranças de uma fazenda vizinha foram identificados como os autores e o produtor rural disse que os indígenas invadiram sua propriedade e destruíram parte da sua plantação de milho. O caso está sob responsabilidade da Funai (Fundação Nacional do Índio). (Rafael Ribeiro)