Festa do Banho de São João
A Festa do Banho de São João de Corumbá e Ladário é uma das maiores manifestações culturais do estado, e após quase dez anos de tramitação, foi aceito seu registro como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil. Festeiros, fiéis e sul-mato-grossenses estão em festa com o reconhecimento nacional que foi decretado na tarde da quarta-feira (19).
Em reunião, o Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) decidiu que a celebração centenária corumbaense receberia o título. O processo deu início em 2012 após pedido da Prefeitura de Corumbá.
Joilson Cruz, diretor-presidente da Fundação de Cultura e do Patrimônio Histórico de Corumbá diz que após anos de etapas de pesquisas realizadas pelo IPHAN, visitas, conversas com a população, a resposta positiva para o registro é de grande importância para a celebração e para o que ela representa.
desejo antigo
“É um desejo antigo da comunidade, dos festeiros e da prefeitura. Isso só mostra o valor histórico que o Banho de São João tem e também é algo muito positivo para a busca de recursos para o evento, pois mais olhos estarão voltados para ele”, comenta Joilson.
O processo de instrução de registro foi conduzido a partir de inúmeras reuniões com os festeiros e personagens relevantes na realização da festa, como os músicos cururueiros, dançarinos das quadrilhas, artistas e demais representantes. Foi feito também um amplo registro fotográfico nos locais dos festejos.
Para o processo de reconhecimento de patrimônios históricos existem duas vertentes: o tombamento, destinado a patrimônios materiais, como monumentos, igrejas, entre outros e o registro, para os imateriais, como expressões artísticas, comidas típicas e festas, como o caso da festa do Banho de São João.
expressão cultural
Roberto Figueiredo, professor de história da UCDB (Universidade Católica Dom Bosco), comenta que para se tornar um patrimônio histórico-cultural imaterial brasileiro, é preciso que a expressão cultural seja de grande importância não só para a região. “Ela precisa ser importante para o país todo. Assim como o ”banho” que extrapola as fronteiras de Corumbá e atinge pessoas de fora também”, destaca.
Para quem mora em Corumbá e que atua diretamente com a cerimônia, a aceitação do registro é um sonho antigo. Alfredo Ferraz, servidor público e festeiro do Banho de São João destaca que o reconhecimento perpetua também na memória de seus avós, que também praticavam rituais para São João.
“É um costume que veio dos meus avós, passou para meu pai e hoje dou continuidade. Esse reconhecimento é uma vitória para nossa cultura corumbaense, pois vai dar visibilidade à cidade e à festa. O Brasil precisa conhecer nossa cultura como algo rico e importante”, comenta.
viola de cocho
O único outro patrimônio histórico imaterial de Mato Grosso do Sul é a viola de cocho, um instrumento musical que possui sonoridade e forma singulares. A viola é feita de forma artesanal com matérias primas provenientes do estado. O instrumento foi reconhecido como patrimônio nacional, registrada no livro dos saberes do patrimônio imaterial brasileiro em dezembro de 2004.
A festa
O Banho de São João é uma demonstração de fé onde os festeiros cumprem suas promessas feitas a São João. Os fiéis banham o santo nas águas do rio Paraguai, assim como o batismo de Jesus feito por João Batista nas águas do Rio Jordão. Existem promessas que duram a vida toda, outras alguns anos, mas o que realmente importa é cultivar a tradição, alimentar a fé e não deixar o momento passar em branco.
A celebração é realizada com a presença de andores e cortejos. Os andores, cada um com suas peculiaridades, se encontram na Ladeira Cunha e Cruz. A reverência entre eles é um dos pontos mais cultuados pelos festeiros, seja na hora da descida, subida ou até mesmo nas margens do rio.
Os cortejos são acompanhados por cânticos em louvor a São João, com ritmo marcado por instrumentos como violões, sanfonas e bumbos e num só coro, os devotos levam a imagem às margens do rio para banhá-lo.
ladeira abaixo
A festividade começa depois das 18 horas do dia 23 de junho. Os festeiros descem a Ladeira Cunha e Cruz que dá acesso ao rio. A celebração começa no caminho, muitos aproveitam a descida para passar por baixo dos andores (segundo a tradição, quem fizer isso 7 vezes se casará no próximo ano), e culmina com a lavagem do santo nas águas do rio. Não se sabe ao certo há quanto tempo existe esse ritual, mas os festeiros mais antigos contam que já praticam a cerimônia há mais de 50 anos.
Para incentivar ainda mais a prática, há um concurso anual para escolher o andor mais bonito da cidade. Os três primeiros colocados são premiados com uma quantia em dinheiro. A avaliação por jurados é realizada no dia 22 de junho, antes do dia principal, e revelada no mesmo dia. De maneira que o andor vencedor tem dois motivos para celebrar no dia 23: a vitória e o dia de São João.
Texto Ellen Prudente e Marcelo Rezende, do jornal o Estado MS impresso