Camila Jara (PT), de 25 anos, é o nome que promete renovação na Câmara dos Vereadores. Eleita com 3.470 votos, ela foi a mulher mais votada para compor a bancada dos vereadores de Campo Grande. Em entrevista para o Jornal O Estado Online, a jovem vereadora falou sobre os desafios e expectativas para os próximos quatro anos.
O Estado Online: Como você se sente sendo a mulher mais votada em Campo Grande para assumir o cargo de vereadora?
Camila: Eu acredito que são vozes na cidade que estão dizendo que precisa ter mais representação, que a maneira que a política está sendo colocada não representa essas pessoas, por isso eu acredito que teve essa votação expressiva. Acho que o processo coletivo fez mais pessoas conhecerem o nosso trabalho e nos ajudarem a construir as nossas propostas também.
O Estado Online: Você tem 25 anos, o que te motivou a ingressar na vida política?
Camila: Sempre entendi a política como um grande instrumento de transformação social. Eu tive exemplos dentro de casa desde muito nova, como minha vó e meu pai, então eu comecei a me engajar em movimentos sociais para tentar transformar essa sociedade aos 15 anos. A partir disso, eu comecei a processar que se quisesse ter uma escola que o conteúdo fosse mais compatível com as dificuldades e realidade que a gente tem no século XXI, esse debate teria que passar pela política. Se eu quisesse ver todas pessoas tendo uma moradia, esse debate teria que passar pela política. Entendo a política como esse grande instrumento de transformação social, até por isso que eu escolhi entrar na faculdade de Ciências Sociais, na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, para entender mais da complexidade da sociedade que a gente está inserida e conseguir devolver isso para sociedade em forma de políticas públicas. Meu planejamento era fazer um concurso para virar técnica legislativa na Câmara Federal e, no meio desse processo, o pessoal que estudava e militava comigo nos movimentos pediu para eu colocar meu nome à disposição. De início eu disse que “não”, questionei: “Tenho 25 anos, não tenho dinheiro, não tenho sobrenome, que eu vou fazer?”. Eles falaram: “Mas você dá entrevista por aí, escreve, incentiva outras mulheres a participarem da política e quando é sua vez você não vai?”. Isso foi um soco no meu estômago e eu falei: “Tá bom, vamos, mas eu não vou fazer nada sozinha, porque sozinha eu não vou chegar em lugar nenhum”. Todo mundo abraçou o projeto e a gente foi construindo as coisas de maneira de maneira coletiva.
O Estado Online: Apenas duas mulheres conseguiram espaço na câmara para 2021, qual a sua avaliação sobre isso?
Camila: Nós estamos em um estado extremamente conservador e quando as mulheres são lançadas candidatas tem várias barreiras dentro do próprio processo estrutural da sociedade que fazem com que essas mulheres não cheguem à vitrine. Essas mulheres saem candidatas e não são instruídas sobre como investir o recurso em candidatura, diferente de homens que geralmente tem vários assessores em volta instruindo. Elas quase não chegam e não estão na vitrine para população ver, é um problema que precisa ser superado. A câmara, enquanto instituição, tem um papel fundamental nisso. Não adianta só falar “não elegeu e pronto”. Isso é algo significativo porque muitas mulheres saíram candidatas nessa eleição, muitas mulheres boas e elas não conseguiram ser eleitas. A gente tem as barreiras partidárias, que são um dos principais fatores, e as barreiras institucionais. Então, acredito que a câmara tem que entender isso, processar e falar: “Para que a gente consiga dialogar mais com o povo, a gente vai precisar mudar esse cenário e vamos mudar desenvolvendo políticas públicas”.
O Estado Online: De que modo você acredita que o seu olhar de uma pessoa mais jovem pode contribuir para Campo Grande?
Camila: Temos uma sociedade que enfrenta os problemas do século XXI e quando temos uma câmara que não tem jovens presentes, alguma coisa vai ser esquecida. Nem todo mundo lá vive todas as realidades, eles não enfrentam todos os problemas. Por exemplo, Campo Grande tem que oferecer mais oportunidades para os jovens, para as mulheres e quando nós temos esses assuntos sendo pautados por alguém que vive uma realidade parecida, conseguimos devolver e colocar uma devolutiva melhor para a sociedade.
O Estado Online: Quais são os seus projetos em relação ao combate a violência contra a mulher que é constante no Estado?
Camila: Primeiro temos que nos preparar para acolher as mulheres vítimas de violência. A Casa da Mulher Brasileira tem que se tornar mais acessível, porque ela se encontra em um lugar distante de vários bairros de Campo Grande. A Casa é aqui perto do Aeroporto, uma mulher que mora no Noroeste, não tem condições financeiras e foi agredida ás 22h, como ela vai chegar na Casa da Mulher Brasileira para passar por toda a triagem e o acolhimento? Temos que ter mais viaturas disponíveis para conseguir atender essa ocorrência lá no Noroeste. Nós também temos que investir em educação, existe uma Lei Municipal que determina que temos que debater gênero nas escolas, mas esse debate não acontece atualmente. Temos que cobrar para que a Secretaria de Educação insira esse debate para que as mulheres entendam que não é normal elas estarem em um relacionamento abusivo e para que os meninos também entendam que não é porque são homens que podem e são superiores às mulheres. Temos que buscar recursos em conjunto com o Governo Federal, Prefeitura, eu também vou ter uma verba de gabinete para que consigamos atender as vítimas que não conseguem chegar à Casa da Mulher Brasileira e, depois disso, a gente também tem que investir em educação para que a mentalidade da sociedade mude. Os índices de feminicídio no Estado são extremamente altos, temos que trabalhar com a prevenção para que essa mulher não chegue a sofrer a agressão.
O Estado Online: Quais os desafios que você acredita que vai enfrentar durante essa caminhada como vereadora?
Camila: Nós tivemos 3.470 votos, mas lá dentro eu sou uma. O meu voto vale enquanto uma pessoa, então quero me articular com a outra vereadora que foi eleita para que juntas possamos defender essas pautas. Além disso, buscar aliados homens para que eles consigam abraçar esses projetos e levar para frente. Desenvolvendo parcerias com os demais vereadores que estão lá que eu espero que abracem essas causas.
O Estado Online: Quais são as suas expectativas para os próximos quatro anos?
Camila: Muito trabalho, a gente vai trabalhar bastante, estamos desenvolvendo maneiras de estarmos mais conectados com a população, porque eu entendo que a força do mandato, que a nossa capacidade de articulação e de diálogo lá dentro vai se dar através da conexão com as pessoas. A gente está desenvolvendo vários mecanismos para que as pessoas estejam cada vez mais dentro do mandato. Estamos desenvolvendo aplicativos para as pessoas participarem mais. O nosso desafio maior vai ser fomentar a participação política e conseguir atender e estabelecer essas propostas, porque pensamos nelas de uma maneira que a se investirmos nessas áreas vamos conseguir uma cidade menos desigual, então, esperamos e vamos brigar para colocar todas as nossas propostas em práticas.
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