Sempre gostei de tirinhas e creio que meu primeiro contato com os jornais foi através delas. Na última quarta-feira (30), eu me preparava para escrever para esta coluna uma homenagem aos 70 anos de criação da tira de jornal Peanuts (também conhecida no Brasil como Minduim). Os famosos quadrinhos, criados por Charles Schulz, que eram protagonizados pelo melancólico menino Charlie Brown e seu carismático cachorrinho Snoopy, porém os planos mudaram quando minha esposa, grande fã da Mafalda, me chama para comentar que na TV tinham acabado de noticiar o falecimento de Joaquín Salvador Lavado, o Quino, criador de Mafalda. Primeiro foi o baque de receber essa triste notícia e em seguida ter a certeza de prestar homenagem a esta grande desenhista.
Quino era filho de imigrantes espanhóis da Andaluzia, nasceu em 1932 na província de Mendoza na Argentina. Desde cedo foi chamado pelos familiares pelo apelido com que é conhecido – Quino – para diferenciá-lo do tio homônimo, desenhista, com quem já aos 3 anos de idade aprendeu o gosto pela arte. Respeitado em muitos países do planeta, Quino é o criador de histórias em quadrinhos mais traduzidas da língua espanhola.
A obra mais famosa de Quino é a tirinha da Mafalda, uma garotinha de 6 anos que odeia sopa e que passa o tempo todo indagando o mundo em que vive. Publicada entre os anos 1964 e 1973, Mafalda questionava todos os problemas políticos, de gênero, e até científicos que afligiam sua alma infantil e, ao mesmo tempo, refletia o conflito que as pessoas da época enfrentavam, sobretudo com a progressiva mudança dos costumes e a introdução da tecnologia no cotidiano.
Uma grande curiosidade sobre Mafalda é que ela foi criada para uma campanha publicitária e foi rejeitada por jornais da época. Mafalda é apaixonada pelos Beatles e talvez com eles tenha aprendido a criticar guerras, políticos corruptos entre outros temas, mas sem nunca perder o otimismo que um mundo melhor virá. Mafalda já foi até protagonista de um filme, produzido na Argentina e lançado em 1982.Além da garotinha, as tirinhas também tornaram célebres personagens como Manolito, Susanita, Guille, Filipe e Libertad. Em 1973, após quase 2 mil tirinhas, Quino decidiu que não desenharia mais Mafalda.
Em vida o desenhista recebeu muitas homenagens. Em 2008, a cidade de Buenos Aires imortalizou-o. Por iniciativa do Museu de Desenho e Ilustração. A empresa Subway promoveu dois murais de Mafalda, na estação Peru, onde fica a histórica Plaza de Mayo. Isto assegurou o conhecimento do seu trabalho para as gerações futuras. Ele também foi condecorado com a Ordem Oficial da Legião de Honra, na França, e o prêmio Príncipe das Astúrias, na Espanha, concedido em 2014.
Logo após a confirmação do falecimento do criador de Mafalda, vários artistas e cartunistas se manifestaram nas redes sociais. Nomes como Laerte Coutinho, Adão Iturrusgarai, criador das “Tirinhas da Aline”, da Folha e André Dahmer, criador dos Malvados, reverenciaram o quadrinista com artes e depoimentos no Twitter.
Certa vez questionado sobre o que achava da Mafalda, o sagaz Quino respondeu; “Não tem importância o que eu penso da Mafalda. O importante é o que a Mafalda pensa de mim.”. Quino faleceu aos 88 anos, na última quarta-feira em decorrência de um AVC e permanece vivo em toda sua obra, especialmente na garotinha Mafalda. Em 2016, em entrevista à agência Efe por ocasião da Feira do Livro de Buenos Aires, Quino reconheceu que gostaria de ser lembrado como “alguém que fez as pessoas pensarem sobre as coisas que acontecem”.
(Texto: Marcelo Rezende)