Artigo no Estado Online: O drama do analfabetismo funcional

Pedro Chaves

Trabalho com educação formal há mais de 50 anos. Estou convencido que só a educação de qualidade pode abrir portas importantes para que o Brasil conquiste um espaço relevante no cenário econômico mundial. A história nos mostra que as nações que ficaram ricas investiram maciçamente em educação e tecnologia de ponta. A produção de mercadoria em tempo de globalização exige muita pesquisa aplicada.

Nesse cenário fica muito difícil disputar os espaços econômicos com força de trabalho com baixa formação educacional. Isso vale para nosso país e para os demais que sonham em criar riqueza, emprego e renda para sua população. Trata-se de um dado concreto da realidade do século XXI marcada pela força da robótica e das comunicações digitais. As novas tecnologias estão em todas as atividades humanas. É uma tendência do presente e do futuro da humanidade.

Assim, diante dessa realidade, me incomoda muito o fato de o Brasil ainda ter 38 milhões de pessoas acima de 15 anos consideradas analfabetas funcionais. Homens e mulheres que frequentaram a escola formal por algum tempo, lê e escreve frases simples, mas não são capazes de interpretar textos e colocar suas ideias no papel. O professor Lazaro Campos Junior, ligado a ONG todos pela educação, informa que de “cada 10 brasileiros, infelizmente, três não conseguem resolver operações básicas que envolvam, por exemplo, o total de uma compra, o cálculo do troco ou valor de prestações sem juros quando vão ao supermercado”.

Nada justifica que o Brasil conviva com essa situação. Falhamos gravemente na formação educacional do nosso povo. Não investimos na educação básica e agora temos que correr urgentemente contra o tempo. Não há outra coisa a fazer que não seja encontrar caminhos para melhorar o nível educacional do povo. Combater o analfabetismo funcional é uma bandeira das mais relevantes e urgentes.

O drama do analfabetismo é mais concentrado nos grupos sociais considerados vulneráveis economicamente. Dados fornecidos pelo Relatório do – 2° Ciclo de Monitoramento das Metas do Plano Educacional de Educação- publicado em 2018, trabalho liderado INEP, mostra que quanto mais pobre é o grupo social maior é taxa de analfabetismo. Para efeito de comparação, 96% dos brancos brasileiros são considerados alfabetizados, ao passo que, no caso dos negros, apenas 90,7% deles conseguiram esse feito.

A taxa de alfabetização formal da população brasileira (incluindo ai os analfabetos funcionais) com mais de 15 anos de idade atingiu o patamar de 93%. Quando se estuda o percentual de alfabetização dos 25% mais ricos a taxa sobe para 98%. Já os 25% mais pobres a taxa cai para 88%. Por regiões a situação também é muito difícil. No Nordeste essa cifra só atinge, dados de 2017, 85% de alfabetizados.

Em 1974, quando inauguramos o prédio da Escola MACE de Campo Grande ficamos sabendo que havia colaboradores considerados analfabetos e analfabetos funcionais. Criamos uma força tarefa e, em pouco tempo, alfabetizamos todos. Depois seguiram outras fases da educação formal. Foi uma iniciativa muito boa para a empresa e para eles.

Falei do exemplo da MACE porque sei que é possível oferecer educação de qualidade a essas pessoas. Trata-se de uma questão de decisão política da sociedade. Havendo interesse resolvemos esse drama em poucos anos. Um exemplo do descaso com os analfabetos funcionais é a Meta 9 do Plano Nacional de Educação que se encontra muito distante de ser atingida até 2024.

* É economista, educador, empresário e Secretário de Estado do Governo de Mato Grosso do Sul.

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