Entrevista da semana com Secretário de Justiça e Segurança de MS

A droga vindo da fronteira já abastece outros continentes, alerta o secretário. Ações integradas voltadas a políticas de combate ao tráfico fizeram o Estado bater recordes de apreensão em 2020

O Estado: A estrutura do Corpo de Bombeiros, hoje, é suficiente para combater incêndios de grandes proporções como o ocorrido no Atacadão? No que evoluímos?

Videira: Nós temos de voltar ao tempo antes do incêndio… Nós temos diversos atacarejos em Campo Grande, que comercializam de tudo, a exemplo dessa unidade, e depois de muitos anos este foi o primeiro a incendiar. Nós temos de averiguar quais foram as causas, mas eu acho que a prevenção nos permitiu longos anos sem grandes acidentes, incidentes e incêndios. Isso é graças a um trabalho de prevenção, de conscientização e de especialização do Corpo de Bombeiros. Todavia, é evidente que você tem de ter os brigadistas e sem eles o dano seria ainda maior. Nós não tivemos nenhuma vítima de morte, nenhuma pessoa lesionada porque pela capacitação dos brigadistas, se não conseguiram conter as chamas, conseguiram salvar o mais importante ali, a vida dos colaboradores e clientes.

Muitos dos equipamentos utilizados pelos bombeiros naquela ação foram adquiridos durante o MS Mais Seguro, maior programa de segurança pública da história de Mato Grosso do Sul, como veículos e a escada Magirus. Isso tudo permitiu o quê? Que os danos fossem minimizados e as vidas humanas, poupadas. Portanto, nos últimos anos, os bombeiros de MS se aperfeiçoaram muito, adquiriram os equipamentos de ponta empregados nas maiores cidades do mundo e aplicaram as técnicas adequadas àquele tipo de incidente. Portanto nosso Corpo de Bombeiros está preparado, só que não é só o Corpo de Bombeiros no combate, é na prevenção, na orientação, na fiscalização e capacitando, por exemplo, os brigadistas.

O Estado: A categoria reclama da defasagem no quadro de servidores, assim como no restante da Segurança Pública. Há previsão para novos concursos públicos?

Videira: O que nós verificamos e não foi só em Mato Grosso do Sul e na Segurança Pública. Com a reforma da Previdência, muitos servidores, policiais, que seriam atingidos com as novas regras, buscaram a aposentadoria e foram para a reserva. Então, houve uma defasagem muito grande em pouco tempo.

Nós tivemos há 25, 30 anos atrás grandes concursos com ingresso de muita gente. E quando você contratou 500 bombeiros, mil policiais militares, esse grupo vai fechar o tempo junto. Com o advento da reforma previdenciária, muita gente que tinha esse tempo, condições de ir para a reserva, se aposentou. Qual é o caminho? Concurso público. Mas são funções muito específicas. Você consegue capacitar um agente penitenciário em 30 dias. Mas um bombeiro, um PM, você gasta um ano. Porque ele precisa receber toda a técnica necessária para ser empregada em um momento de crise, sob pena de você ter ele mesmo lesionado ou morto ou não conseguir salvar vidas, reprimir o crime. A capacitação exige constante aprimoramento e capacitação. Hoje nós temos o concurso público só para os bombeiros, com 400 vagas e, pela primeira vez na história do Estado, estamos formando a primeira turma de oficiais aqui mesmo, na Academia da Polícia Militar e dos Bombeiros.

A escada Magirus, um investimento de R$ 7 milhões, foi fundamental para os bombeiros avaliarem, de cima, qual a melhor estratégia para se combater o fogo. Você convocando policiais da reserva, trazendo para o serviço ativo, e contratando novos são formas de minimizar e ter o efetivo necessário. Hoje, MS tem buscado otimizar os investimentos, reduzir custos e melhorar a qualidade dos serviços prestados, desde a prevenção, a orientação, até o combate.

O Estado: Neste ano MS bateu o recorde de apreensões de drogas. E isso em plena pandemia. Como o senhor avalia esse trabalho desempenhado no Estado e qual a colaboração do governo federal?

Videira: Primeiro precisamos olhar a posição geográfica de MS, estrategicamente posicionado entre dois países, Paraguai e Bolívia, que mundialmente são conhecidos como grandes produtores de drogas, e ainda assim, com mais de 1,5 mil km de fronteira, a maioria seca, e possui os menores índices de criminalidade do país. É o Estado que possui os maiores índices de esclarecimento de homicídios, com 60%. É recordista na apreensão de drogas. Você tem números de presos trabalhando e estudando muito maiores que a média nacional. E por que isso? São políticas de Justiça e Segurança Pública, voltadas para a nossa realidade.

Quando você combate o tráfico de drogas em MS, você está combatendo para o resto do país e até em outros continentes, para onde os grandes carregamentos têm como destino. Há de se ter políticas de combate ao tráfico voltadas para as fronteiras e isso exige uma ação integrada não só dos órgãos estaduais, mas principalmente também dos órgãos federais, que são aqueles que constitucionalmente têm obrigações de investigar o tráfico de drogas.

Nós agimos por meio de atuação delegada, com termo de cooperação. E a gente tem buscado nos últimos anos mostrar para o governo federal que é muito mais inteligente se investir na fronteira. E, neste sentido, nós estamos alinhados com essa política junto de Paraná, Mato Grosso e Rondônia, que fazem a primeira barreira com os outros países. E aí se faz necessário o governo federal também robustecer o policiamento nos estados com que temos divisas – Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso.

Por exemplo, investe no reforço de patrulha das rodovias federais por meio do aumento do efetivo da Polícia Rodoviária Federal. Você consegue assim ter barreiras secundárias. Na maioria das nossas divisas nós temos barreiras naturais, como, por exemplo, o Rio Paraná, o Paranapanema. E isso permite a você concentrar melhor a fiscalização, ser mais eficiente. E um exemplo é a Operação Hórus (desencadeada em parceria com o Ministério da Justiça e Segurança Pública) que investiu, e foi uma sugestão de MS, na posse do atual presidente, de você incrementar a fiscalização no eixo entre Paraná e nosso Estado. É de extrema importância isso. A integração deve haver entre as forças estaduais dos estados, das forças federais e das Forças Armadas.

As Forças Armadas têm como atribuição em qualquer país do mundo proteger as fronteiras e a população brasileira do inimigo em comum de todos, que é o traficante, o crime organizado. Essa integração permite uma otimização de recursos, potencializar os resultados e diminuir os custos. Esse resultado você não vê só aqui, o recorde de apreensão de drogas em MS não é só dele, mas do grande centro consumidor. Porém, há de se ter uma preocupação com o resultado da excelência da Segurança Pública. O maior número de drogas e veículos apreendidos, mas também o de pessoas encarceradas. A droga você incinera, o carro leiloa, o bem aliena e o preso você tem de devolver ele para a sociedade, e hoje nós temos uma das maiores populações carcerárias do mundo. Por quê? Porque somos eficientes, não só nas forças estaduais, mas também nas federais.

O Estado é hoje o que mais tem parcerias para que os presos possam trabalhar e estudar, se capacitarem e voltarem melhores à sociedade. E 40% da nossa carcerária, que hoje é de cerca de 20 mil presos, é composta por presos do tráfico. Desse grupo de 8 mil, quase 5 mil são de outros estados. Então, se você mantém esse cidadão por aqui, em um longo período, ele vai fazer o quê? Trazer a família dele. E isso vai gerar impacto na assistência social, na infraestrutura, na habitação, educação e saúde. Mato Grosso do Sul, que já apreendeu mais de 540 toneladas de drogas, um aumento de 109% comparado ao mesmo período no ano passado, presta um excelente serviço não só para a nossa população, mas para
a de outros estados e países.

O Estado: Em relação ao crime organizado, às facções criminosas, recentemente a PF identificou que diversas lideranças atuais da principal delas atuam em MS e nos seus presídios, até pela proximidade com as fronteiras. Como o senhor vê essa questão?

Videira: Com essa ação eficiente de isolamento das lideranças (transferidas para presídios federais), esse papel foi outorgado para muitos que estão nas ruas. O nome já diz, crime organizado, e se o crime está organizado, nós temos de estar mais ainda. Todavia o crime não está organizado só em um estado, ele está no país e em mais de um continente inteiro. Isso exige uma integração das forças estaduais, federais e internacionais. Quando DEA e Senad (órgãos da polícia paraguaia) atuam junto com a Polícia Federal, nós temos uma eficiência maior.

Quando a PF e as polícias estaduais atuam não só combatendo o tráfico de drogas, mas também apreendendo e confiscando bens, você tem um efeito maior. Mas tudo isso exige principalmente uma fina sintonia, principalmente dos setores da inteligência, porque ela aplicada nos setores atuais permite que você seja mais eficiente. Senão você vai ter exércitos, altamente custosos, para combater o crime. Então há de se empregar principalmente a inteligência para se ter uma maneira mais eficiente de se atacar as organizações criminosas.

E esse papel em Mato Grosso do Sul exige não só a união dos órgãos de segurança públicas estaduais, mas também federais, das Forças Armadas, que têm poder de polícia nas áreas de fronteira, e precisamos muito delas como apoio nas ações. Quando você tem instalados, na fronteira com a Bolívia, o Paraguai, três radares, você tem um controle maior do tráfego aéreo de baixa altitude, que é usado pelo tráfico e contrabando. Portanto, quando o governo federal, por meio da Aeronáutica, consegue interceptar aeronaves que voam em baixa altitude, você tem uma ação inteligente. E isso exige para o tráfico migrar para outros caminhos. E daí a importância de você ter um robustecimento de fiscalização, não só nas vias pavimentadas.

(Texto: Rafael Ribeiro)

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