A doença do medo

Nas últimas semanas, a sociedade passou a viver um mundo completamente novo e, principalmente, foi tomada pela angústia. Medo de sair de casa, de ficar doente, de vir a morrer, de perder o emprego e de não conseguir pagar as contas em dia. Medo até de não conseguir comprar o que comer. Acima de tudo, veio a solidão. Para preservar a saúde, muitos estão impedidos de se relacionar com os filhos, netos e amigos. Ir à academia se exercitar, sair para trabalhar em serviços essenciais, fazer compras ou até mesmo deixar o lixo na rua, tornou-se um grande risco. Por tudo isso, cresce a preocupação com a saúde mental.

Aumento do estresse

A ameaça de contrair o novo coronavírus mudou totalmente a dinâmica das pessoas. Nessa guerra contra a Covid-19, um fator não pode ser desconsiderado e está levando muita gente a procurar psiquiatras e psicólogos por meio de consultas por aplicativos: o aumento do estresse. Silencioso, porém altamente prejudicial à saúde humana, o estresse e a ansiedade podem desencadear doenças como depressão, síndrome do pânico e até risco de suicídio. “Algumas pessoas estão apavoradas e certamente o número de depressivos vai aumentar muito, sobretudo as pessoas com TOC e hiperpreocupadas com o que acontecerá em relação ao contágio e à vida financeira”, diz o psiquiatra Breno Serson. É fato que experiências catastróficas sempre deixam marcas. A China, o epicentro do novo coronavírus, está vivenciando essa experiência. Até 20% de seus habitantes estão com sintomas de transtorno de estresse pós-traumático (TSPT), de acordo com um estudo recente da Universidade Médica Naval de Shanghai.

O mesmo ocorreu em Hong Kong, que sofreu em 2003 a epidemia da síndrome respiratória aguda (SARS). Lá, foi possível constatar que os danos psicológicos foram duradouros: 40% dos que contraíram o vírus, apresentaram o TSPT dez anos depois. É esperado que no Brasil o novo coronavírus também deixe sequelas. Para se ter ideia, 5,8% da população do País sofre com depressão e 32 brasileiros se suicidam todos os dias. Outro tipo de doença que poderá ter consequências em massa é o das pessoas que sofrem síndrome do pânico, ou seja, um número estimado entre 4 e 6 milhões de brasileiros.“Quanto maior for a quarentena, maior podem ser os estragos na mente das pessoas. Claro que os que têm predisposições são os mais afetados nesse momento”, diz Dora Sampaio Góes, psicóloga do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo (IPq/HCFMUSP). Em seus atendimentos remotos, ela constatou um grande aumento nos casos de irritabilidade e ansiedade entre seus pacientes.

Terapia alternativa

A boa notícia é que medidas simples podem atenuar os efeitos da quarentena e a ameaça do surgimento de doenças psíquicas. Estabelecer uma rotina é fundamental para que as pessoas consigam se organizar emocionalmente. Recomenda-se assistir a filmes de entretenimento não agressivos, ler e realizar trabalhos terapêuticos e manuais, como crochê, por exemplo. “É importante que as pessoas percebam que dominam sua vida e seu tempo, e que estão fazendo escolhas. É possível ser autor da própria história, mesmo dentro de casa”, diz Dora. Além disso, especialistas dizem que esta é uma oportunidade para as pessoas se voltarem para si próprias e seus verdadeiros valores. “Colocar em evidência a empatia e o amor ao próximo causa uma sensação de bem-estar conectada ao todo e ao bem comum. A parte que eu alimentar é a que vai crescer em mim”, explica Dora. Integrante do grupo de dependências tecnológicas do Hospital das Clínicas, ela alerta para a importância de limitar o uso de ferramentas online nesse momento. Mandar mensagens para as pessoas e fazer videoconferências, por exemplo, despertam o sentimento “de pertencimento coletivo e atenuam o estresse”.

O apoio psicoterapêutico também é fundamental e diversas iniciativas gratuitas estão surgindo para atender pessoas por telefone e por videoconferência. Exercícios físicos também estão sendo disponibilizados online, por diferentes especialistas. Essa parafernália eletrônica está funcionando bem para controlar a ansiedade da professora Fernanda Antunes, de uma escola pública de São José dos Campos. Diagnosticada com síndrome do pânico, a doença está sob controle por conta do uso correto de medicamentos, bem como a realização de meditação, como terapia alternativa. Há uma semana sem sair de casa por conta dos pais idosos, ela recorre a aplicativos para manter o equilíbrio e evitar crises neste momento crítico. “Quando vejo que a situação está ficando feia, recorro a alternativas que me deixam melhor. Fiz uma meditação holística em casa, comecei uma novena e à noite rezo o terço”, diz ela, que não vê a hora de voltar ao trabalho presencial. “Além disso, tenho feito exercício físico e pretendo manter o tratamento médico online. Tento não pensar no que pode acontecer no futuro para não enlouquecer”, diz Fernanda.

(Texto: IstoÉ)

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